segunda-feira, 29 de março de 2010

Índice Internacional de Direitos de Propriedade (IIDP) – Relatório 2010

O presente relatório faz uma avaliação da protecção dos direitos de propriedade em 125 países. Os direitos de propriedade são referidos como sendo instrumentais no auxílio ao homem nas suas transacções e assentam sobre a lei e costumes de uma certa sociedade. Quer isto dizer que as trocas comerciais requerem que sobre o seu objecto não haja dúvidas sobre a quem pertence a posse do mesmo e que a legislação dessa sociedade seja eficaz no reconhecimento dessa posse.
Quaisquer que seja a classificação a ser feita levanta-nos sempre uma questão. Classificação de quê? Ou, se quisermos, o que está a ser avaliado? No caso do relatório em apreço, a avaliação assenta em três categorias principais, a saber:

Ambiente Politico Legal – nesta categoria os países foram avaliados para aferir se os seus aparelhos judiciários são independentes de grupos políticos e empresarias, se há controlo da corrupção, se há estabilidade política e se são estados de direitos. Tendo em conta que os direitos de propriedade têm a ver com a propriedade privada de cada cidadão, não há dúvidas que os itens usados são indispensáveis para que cada cidadão disponha da maneira que lhe convier os seus direitos garantindo, desse modo, a sua transacção e consequente produção de rendimentos.

Direitos a propriedade material – nesta categoria os países foram avaliados para apurar se existe protecção judicial da propriedade privada, como é o processo de registo da propriedade (em termos de negócios conta muito o tempo e os procedimentos para o registo da propriedade) e o acesso ao crédito, já que a aquisição de propriedade depende da facilidade ou não do acesso ao credito).

Direitos a propriedade intelectual – nesta categoria pretendeu-se apurar se os países protegem ou não a propriedade intelectual, se protegem as patentes e qual o nível de pirataria dos direitos de autor. Nesta categoria parece-nos que as três variáveis usadas não foram identificadas cuidadosamente. Se não vejamos: é problemático separar protecção de patentes da protecção de direitos a propriedade intelectual, já que as patentes fazem parte da propriedade intelectual. Ademais, a análise do quesito protecção de patentes é feita com base num estudo de 2005 e a análise da pirataria de direitos de autor é feita com base num estudo de 2009 apoiado por um estudo de 2008. Parece-nos que o uso de dados de há vários anos atrás para classificar os países em 2010 não é aconselhável porque pode dar resultados não fiáveis. Anote-se, igualmente, a omissão feita a análise do registo dos direitos de propriedade intelectual, nos casos em que tal ocorre, como é o caso das marcas, patentes, logótipos, etc, à semelhança do que foi feito nos direitos materiais. Para além da importância de aferir o tempo e procedimentos despendidos em cada país, garantia a uniformidade de critérios.

O estudo aponta como uma das limitantes ao trabalho ora apresentado, a falta de dados sobre marcas registadas. Ora este é um dado importante quando se pretende analisar a protecção que os países dão aos direitos intelectuais, para alem da sua importância na actividade económica das empresas, em particular, e dos países, em geral. No caso particular de Moçambique, não se percebe como não se obteve estes dados, já que a instituição responsável pela administração dos direitos de propriedade industrial – o Instituto da Propriedade Industrial – possui dados actualizados sobre o registo de marcas e disponibiliza-os quando solicitado para o efeito.

Os resultados da pesquisa são apresentados apenas em termos numéricos, não há nenhuma explicação sobre o que significam as pontuações atribuídas a cada país. Na classificação geral, por exemplo, não há uma explicação sobre o que significa a Finlândia estar no topo da mesma com 8.8 pontos, o Bangladesh estar no fim da tabela com 2.9, ou Moçambique estar na posição 95 com 4.2 pontos. O que é que uns têm que outros não tenham? Em nosso humilde entender, a explicação das pontuações ajudaria a perceber que critérios orientaram os pesquisadores na atribuição das pontuações.
Na classificação por países, a falta de explicação leva-nos à assombração sobre a pontuação atribuída a Moçambique (4.2 pontos no Ambiente Politico Legal, 4.6 nos Direitos à Propriedade Material e 3.8 pontos nos Direitos à Propriedade Intelectual). No caso particular dos Direitos de Propriedade Intelectual, não percebemos como Moçambique teve uma pontuação tão baixa. Se não vejamos:
- Na categoria de protecção dos direitos, não há dúvidas que o país garante a protecção dos mesmos, possuindo para o efeito legislação específica (Lei dos Direitos do Autor, Código da Propriedade Industrial, para além da Própria Constituição da República que reconhece o direito à propriedade e à liberdade de criação científica, técnica, literária e artística e protege os direitos inerentes a propriedade intelectual (artigo 94).
- Na categoria da protecção de patentes, o Código da Propriedade Industrial assegura a protecção por um período de 20 anos e dispõe de mecanismos de tutela para os casos de ilicitude. Acresce dizer que o país aderiu aos mecanismos internacionais de protecção, como o Tratado de Cooperação em matéria de Patentes (PCT, em Inglês), o Protocolo de Harare de 1982, referente ao registo regional de patentes, a Convenção de Paris de 1883, relativa a protecção da Propriedade Industrial.
- Na categoria Pirataria de Direitos de Autor, reconhecemos que o país ainda tem fragilidades para o seu combate eficaz, sobretudo em matérias de material audiovisual e fonográfico.
É a indicação do que foi acima exposto que nos faz ter sérias reservas na pontuação atribuída a Moçambique o que, como dissemos, é adensado pela omissão da explicação dos pontos atribuídos a cada país.
Preocupa-nos igualmente a não indicação no relatório sobre as fontes nacionais, ou seja, quais foram as instituições moçambicanas contactadas? É que o relatório apresenta uma profusão de estudos e organismos internacionais que serviram de fonte de informação usada na pesquisa, mas não apresenta nenhum estudo ou organismo nacional contactado para o mesmo efeito o que é, quanto a nós, problemático.

Uma outra omissão que nos preocupa é referente às recomendações. O relatório não oferece recomendações aos países com fraca classificação sobre o que deve ser alterado para que elevem os seus índices de protecção aos direitos de propriedade. A nossa opinião é a de que a mera constatação da situação actual dos países, por si só, não levará a uma maior e melhor tutela dos direitos de propriedade. Seria de todo útil recomendar acções concretas que devem ser tomadas pelos países para a melhoria da sua situação nesta matéria. A ser feito, o relatório constituir-se-ia num documento instrumental quer para os profissionais das áreas abrangidas, quer para os próprios países.

É esta a nossa singela opinião.
Obs: o comentário supra foi enviado ao Cemo (Centro de Estudos Moçambicanos e Internacionais), por ocasião da publicação do relatório em Moçambicano, levado a cabo por aquela instituição no passado dia 9, na Cidade de Maputo.

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