terça-feira, 28 de abril de 2020

TRATADO DE PEQUIM DA OMPI SOBRE APRESENTAÇÕES AUDIOVISUAIS ENTRA EM VIGOR HOJE


O Tratado, sobre direitos de propriedade intelectual de actores e intérpretes audiovisuais, visa permitir  que os actores de televisão e cinema, músicos, dançarinos, coreógrafos e outros ganhem a vida com o seu trabalho.
Moçambique ainda não ratificou o acordo.

A baixo, a mensagem do Director Geral da OMPI :



segunda-feira, 27 de abril de 2020

quarta-feira, 15 de abril de 2020

OS DIREITOS DE PATENTES EM MEIO AO COVID-19

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O noticiário da RDA-Africa de sexta-feira, 10 de Abril corrente, edição das 12 horas de Maputo, trazia uma notícia que despertou a minha atenção. A mesma fazia alusão ao facto de na Espanha uma empresa construtora de automóveis ter desenvolvido um ventilador a partir de motores de limpa pára-brisas. Os ventiladores seriam colocados à disposição dos servicos de saúde daquele país para ajudar no combate ao covid-19. O detalhe precioso estava no fim da noticia. Os fabricantes não iriam registar a invenção, de modo que sobre ela não recaíssem direitos de propriedade intelectual e, desse modo, permitir que os países que necessitem (sobretudo em Africa e América Latina) possam fabricar os seus ventiladores[1].
Trata-se um extraordinário gesto de altruísmo. Numa altura em que várias pessoas ou organizações procuram tirar vantagens nos preços de alimentos, produtos e equipamentos úteis para o combate à pandemia, estes inventores fazem exactamente o contrário, disponibilizam a sua invenção a título gratuito.
Motivado por esta e outras situações, achei por bem revisitar o que a legislação sobre patentes prevê para os casos em que as invenções podem ser úteis para o combate a pandemias ou outros perigos que atentam contra a saúde pública.
Legislação nacional
Todo o inventor nacional encontra o amparo para os seus direitos no artigo 74 do Código da Propriedade Industrial (doravante CPI). Com efeito, este dispositivo legal estabelece no seu nº 1 que “Sem prejuízo de outras disposições do presente capítulo, o titular de uma patente goza dos seguintes direitos exclusivos relativos à invenção: a) Exploração da invenção patenteada; b) Concessão ou transmissão da patente; c) Celebração de contratos de licença de exploração da invenção; d) Oposição ao uso indevido da patente”.
Isto quer dizer que o inventor tem, não só o direito de usar/ explorar a sua invenção, mas também de sobre ela celebrar diversos tipos de contrato com potenciais interessados, bem como tem o direito de impedir que a mesma seja usada por terceiros sem a sua autorização. De contrario será considerada violação dos direitos exclusivos da patente, prevista e punida pelo artigo 214 do CPI.
Entretanto, esta regra admite excepções motivadas por determinadas situações, como é o caso da eclosão de pandemias, como a que actualmente arrasa o mundo inteiro. O mecanismo que permite a excepção é chamado de Licença Obrigatória, prevista no artigo 92 do CPI. Este mecanismo é accionado sempre que haja justificados motivos de interesse público, nomeadamente quando a invenção é crucial para questões de saúde pública. Nestes casos o Ministério de Tutela (na circunstância o da Saúde) autoriza a exploração da invenção, mediante pedido dirigido ao IPI[2].
Em situações extremas como a de emergência nacional na qual nos encontramos agora[3], não há lugar para o pedido de licença obrigatória. O Governo, através do Ministério de tutela, simplesmente autoriza o uso da invenção pelo tempo que for necessário para conter a pandemia[4]. É o chamado Princípio da Proporcionalidade que de acordo com BARBOSA, Denis (2003), a sua aplicação requere que “(…) no equilíbrio entre dois requisitos constitucionais – a protecção da propriedade e o do interesse social – aplique-se o princípio da proporcionalidade. Ou seja, só se faça prevalecer o interesse colectivo até a proporção exacta, e não mais além, necessária para satisfazer tal interesse. No pertinente, isto significa que a licença compulsória, segundo os parâmetros constitucionais, não pode exceder a extensão, a duração e a forma indispensável para suprir o interesse público relevante, ou para reprimir o abuso da patente ou do poder económico”[5].
Assim, se, por exemplo, algum moçambicano inventasse algo que ajudasse no combate ao Covid-19, e tendo o Governo declarado o estado de emergência, o governo poderia recorrer à licença obrigatória para limitar os direitos exclusivos do titular da patente e, desse modo, autorizar a exploração da invenção por terceiros. Ainda assim, é importante mencionar que os interesses do inventor estão sempre acautelados. Com efeito, nos termos do nº 6 do artigo 92 do CPI, “o titular da patente recebe uma remuneração adequada, paga pelo beneficiário, ajustada a cada caso concreto, tendo em conta o valor económico da patente”. No caso de cura de uma pandemia, a remuneração não será paga por cada uma das pessoas que foi assistida, mas sim pelo Governo.

Legislação internacional
A protecção dos direitos de propriedade intelectual tem como seu marco regulatório a Convenção de Paris para a Protecção da Propriedade Industrial, de 20 de Março de 1883, da qual Moçambique é signatário[6].
A convenção dá aos membros da União em que se constituem os países que à ela aderiram a prerrogativa de incluírem na suas legislações nacionais previsões sobre a licença obrigatória, como forma de “prevenir os abusos que poderiam resultar do exercício do direito exclusivo conferido pela patente, como, por exemplo, a falta de exploração[7]. Como se pode constatar, a enumeração é exemplificativa, pelo que deve ser feita uma interpretação extensiva desta norma, para incluir situações de emergência nacional, saúde publica, entre outros.
Previsão similar encontra-se igualmente no Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (ADPIC), mais conhecido pela tradução em Inglês de Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights (TRIPS). Este acordo é o instrumento internacional mais amplo de tutela da propriedade intelectual e vincula os Estados membros da Organização Mundial do Comercio[8]. No seu artigo 31 com a epígrafe “outros usos sem autorização do titular do direito”, o acordo estabelece que os estados membros podem autorizar o uso da invenção por terceiros, desde que as respectivas legislações nacionais o permitam. Prevê, igualmente, que o uso por terceiros deve ser comunicado ao detentor do direito, mas essa comunicação não é exigível “nos casos de emergência ou outras circunstâncias de extrema urgência ou em casos de uso público não comercial”[9].
Como facilmente se pode constatar, o nosso CPI está “alinhado” com a legislação internacional no que diz respeito a matéria em aqui análise. Nem poderia ser de outra maneira, uma vez que Moçambique aderiu e acolheu aqueles instrumentos no seu ordenamento jurídico nacional.

Sobre a função social da propriedade intelectual
Os dispositivos legais analisados acima e que asseguram o uso autorizado de patentes por terceiros enquadram-se naquilo que a doutrina conhece como o Princípio da Função Social da Propriedade Intelectual e que consiste no entendimento de que apesar dos direitos de propriedade intelectual, em geral, e de patentes, em particular, garantirem aos seus titulares a protecção e o direito exclusivo do seu uso, esses direitos devem, sempre que necessário, desempenhar uma função social como forma de ajudar os países a atenderem o desenvolvimento social. Ou seja, a propriedade intelectual deve estar sujeita aos imperativos do interesse nacional, repetimos, sempre que necessário. Dito de outra forma, todo o detentor de direitos de propriedade intelectual tem um poder-dever em relação à comunidade, ou seja, a sua propriedade deve estar ao serviço da comunidade sempre que houver justificados motivos para o efeito.
Segundo VARELLA, Marcelo (1996) citado por CARVALHO, Thiago e THOMÉ, Karim (2015)[10] “a função social é um limite encontrado pelo legislador para delinear a propriedade, em obediência ao princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse particular”.
Quer isto dizer que a função social da propriedade não é uma restrição à propriedade, e sim ao seu uso indevido. Nas palavras de BARBOSA, Denis (2003) “a função social seria toda transcendência do interesse egoístico”[11]. Quer isto dizer que o titular do direito deve abrir mão dos seus interesses pessoais e aceitar que o mesmo seja posto ao serviço da comunidade.
No caso de Moçambique, este princípio está de acordo com a própria natureza do Estado definida pela Constituição da República, que no seu artigo 1 estabelece que “a República de Moçambique é um Estado independente, soberano, democrático e de justiça social”. Esta definição tem como consequência o alinhamento de toda a organização e acção do Estado para atingir tal desiderato[12].

Nota conclusiva
Sendo Mocambique um país não desenvolvido e, portanto, sem um avanço tecnológico por aí além, as pessoas não consideram a hipótese de, a breve trecho, surgir uma invenção de grande impacto nacional ou mesmo internacional. Aliás, uma leitura atenta do Boletim da Propriedade Industrial publicado mensalmente pelo IPI reforça essa percepção, uma vez é notório que as invenções que têm siso registadas pêlos nossos inventores são aquelas conhecidas como “pequenas patentes”, no sentido de que são invenções não muito desenvolvidas e que visam, sobretudo, atender aos problemas básicos enfrentados pelas comunidades.
Ainda assim, não deve ser descurado o engenho humano que, a qualquer momento, pode levar à invenção de algo com importância e repercussão nacional, seja para ajudar a combater uma pandemia, seja para ajudar a resolver o crónico problema da fome/ subnutrição que ainda afecta uma grande percentagem de moçambicanos, ou ainda para resolver um eventual “apagão” tecnológico no sistema financeiro nacional, entre várias outras situações. Nessa altura, haverá que analisar de forma cuidadosa a situação para aferir de que modo o interesse particular do inventos e a necessidade da comunidade podem ser conciliados.



[2] Artigo 92, números 1 a 3, do CPI.

[3] Ver Decreto Presidencial nº 11/2020, de 30 de Março, que declara o estado de emergência, por razões de calamidade pública, em todo o território nacional.

[4] Artigo 92, números 4 a 7, do CPI.

[5]. In: BARBOSA, Denis (2003), A Nova Regulamentação da Licença Compulsória Por Interesse Público. Artigo publicado nas edições da Gazeta Mercantil de 17, 18 e 19 de Novembro de 2003 e disponível em http://denisbarbosa.addr.com/trabalhospi.htm, consultado a 14 e 15 de Abril de 2020.

[6] A adesão de Moçambique foi feita através da Resolução nº 21/97, de 12 de Agosto.

[7] Artigo 5, nº 2, da Convenção de Paris.

[8] As normas deste acordo entraram em vigor integralmente para Moçambique no ano 2013.

[9] Alínea b) do artigo 31 do Acordo de TRIPS.

[10] In: A Função Social do Direito de Propriedade Intelectual Brasileiro Segundo Uma Perspectiva Sociológica Económica. Revista Direito em Acção, Brasília, v.14, n.1, p.103-125, Jan./Jun.2015. Artigo disponível em file:///C:/Users/Sergio%20Braz/Downloads/6713-29614-1-PB.pdf, consultado a 14 de Abril 2020.

[11] Barbosa, Denis (2003), A função social dos direitos de propriedade industrial. Artigo disponível em http://www.denisbarbosa.addr.com/arquivos/palestras/funcao_social_direitos_pi.pdf, consultado a 13 de Abril de 2020.

[12] Vide artigo 11 sobre os Objectivos Fundamentais, artigo 96 sobre a Política Económica e artigo 101 sobre a Coordenação da Actividade Económica.

quarta-feira, 8 de abril de 2020

O IMPACTO DO COVID-19 NO SISTEMA NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL

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A cada dia que passa as notícias que chegam de todo o mundo revelam o rasto devastador dos efeitos da pandemia do COVID-19. Os governos nacionais têm vindo a tomar as medidas necessárias e que se impõem para combater o mal  e evitar o seu alastramento dentro dos respectivos territórios. Da declaração do estado de emergência ao “shutdown”, passando pelo isolamento e/ ou distanciamento social, as medidas variam de país para país, dependendo da situação concreta de cada um deles.
Em Moçambique, o Presidente da República declarou o estado de emergência para o período de 1 a 30 de Abril corrente[1]. Quer as instituições públicas quer as privadas continuam operacionais. Isto quer dizer que os escritórios de propriedade industrial, como é o caso do da BAIPA, continuam a operar normalmente. Quer dizer, também, que o Instituto da Propriedade Industrial (IPI) continua a funcionar, ainda que de forma condicionada como consequência da determinação do Governo[2].
Entretanto, causa perplexidade o facto do IPI não ter, até ao momento, tomado medidas especificas face à conjuntura mundial provocada pelo Covid-19. Com o estado de emergência ou “shutdown” em que muitos países se encontram, vários serviços encontram-se comprometidos. São os casos dos serviços de notariado, conservatórias de registo de entidades legais, correios, aviação, etc. Isto significa que neste momento é difícil, para não dizer impossível, a obtenção de procurações, declarações de cessão/ transmissão de direitos, certificados de mudança de identidade de sociedades comerciais, documentos de prioridade, documentos de patentes, entre outros. Ou seja, as medidas de combate e prevenção do Covid-19 afectaram negativamente a capacidade de todos de realizar negócios da maneira normal, na medida em que todas as firmas encontram-se a trabalhar de forma isolada e remota, sem acesso permitido aos recursos essenciais para a cabal realização das suas actividades. Por conseguinte, torna-se difícil o cumprimento de certos procedimentos junto do IPI para o registo e/ ou averbamento e manutenção dos direitos de propriedade industrial. E isto acontece ao contrário do que se verifica em vários outros países, onde os respectivos escritórios nacionais de marcas e patentes tomaram medidas concretas face às circunstâncias actuais[3].
Numa apatia comprometedora, o IPI mantem os mesmos procedimentos e, como se isso não bastasse, continua a emitir notificações exigindo o cumprimento de certas formalidades e prazos, sob pena de não o fazendo os titulares ou requerentes verem os seus direitos perdidos. Nada mais surreal.
Mas esta actuação do IPI não surpreende à quem seja utilizador frequente e atento dos seus servicos, pois a incúria é o referencial do seu “modus operandi”. Esta inércia do IPI está de acordo com a sua habitual omissão e falta de acção perante processos relevantes (oposições, recusas provisorias, reclamações, etc) que se acumulam de ano para ano sem que sobre eles seja tomada alguma decisão; está de acordo com a sua falta de visão estratégica e falta de articulação do seu funcionamento com o que se passa no campo da propriedade intelectual a nível internacional; está de acordo com a sua falta de transparência materializada, à titulo de exemplo, na não divulgação dos dados estatísticos anuais sobre o registo e manutenção dos direitos de propriedade industrial no país; está de acordo com a sua medonha incompetência que o torna numa instituição ultrapassada, fraca, ineficaz e inoperante.
Assim, perante à avalancha de solicitações, questionamentos e preocupações que nos chegam de todo o mundo, a nossa resposta continua a ser de manter a serenidade e aguardar que, de algum modo, se faça luz e o IPI acorde da sua modorra e aja de acordo com o que se espera de quem tem o mandato e a missão de administrar o sistema nacional da propriedade industrial e esteja cônscio do que isso realmente significa.


[1] Vide Decreto Presidencial nº 11/2020, de 30 de Março, que Declara o Estado de Emergência, Por Razões de Calamidade Pública, Em Todo o Território Nacional.

[2] O Artigo 17, nº 3, do Decreto n.º 12/2020 que Aprova as medidas de execução  administrativa para a prevenção e contenção da propagação da pandemia COVID-19, a vigorar durante o Estado de Emergência, estabelece que “o efectivo laboral presencial é reduzido para uma quantidade não superior a 1/3,  com rotatividade das equipas de serviço de 15 em 15 dias”.

[3] Por exemplo, alguns escritórios, como o Instituto Europeu de Patentes (EPO), Índia e Reino Unido, automaticamente prorrogaram os prazos, enquanto outros se abstiveram de qualquer extensão, mas permitem, em determinadas circunstâncias, acções correctivas por direitos perdidos devido aos efeitos do Coronavírus. Mais detalhes no artigo públicado pelo The JD Supra Knowledge Center, disponível em https://www.jdsupra.com/legalnews/coronavirus-impacts-intellectual-76757/.
A 31 de Março de 2020 o escritório de patentes e marcas dos EUA (The United States Patent and Trademark Office (USPTO)) anunciou a extensão dos prazos permitidos para submeter certos documentos relacionados a patentes e marcas e para o pagamento de determinadas taxas exigidas (mais detalhes na sua página de Internet disponível em https://www.uspto.gov.

HISTÓRICO! ESTADOS MEMBROS DA OMPI ADOPTAM TRATADO SOBRE PROPRIEDADE INTELECTUAL, RECURSOS GENÉTICOS E CONHECIMENTO TRADICIONAL ASSOCIADO

  Os Estados membros da OMPI aprovaram no dia 24 de Maio corrente um novo tratado inovador relacionado com a propriedade intelectual (PI), o...